“Missão: Impossível — O Acerto de Final” é o ápice de uma franquia que se construiu de forma sólida ao longo de quase 30 anos e que conseguiu atingir o auge de público e crítica do meio para o final, caminho contrário a muitas franquias que não sabem a hora de parar.
A oitava parte da sequência que tem Tom Cruise como selo de qualidade e identidade chegou prometendo ser o máximo da ação e da tensão em comparação com os filmes anteriores. O que por si só já é algo muito ambicioso, visto que o agente Ethan Hunt (Cruise) protagonizou pérolas como “Protocolo Fantasma”, “Nação Secreta” e “Efeito Fallout” e o menos interessante em termos de roteiro, mas grandioso na produção, “O Acerto de Contas”, predecessor imediato do atual lançamento.
O grande responsável pela guinada de Missão: Impossível foi Christopher McQuarrie. O diretor assumiu após os laboratórios autocontidos de Brian De Palma, John Woo, J.J. Abrams e Brad Bird. McQuarrie começou a escalar os níveis de ameaça e passou a conectar os filmes de forma leve e elegante, sem que fosse preciso ver os anteriores para virar fã assistindo aos longas separadamente, regra quebrada justamente no suposto encerramento da franquia e onde reside um dos pontos fracos do novo projeto.

Luther (Ving Rhames) está debilitado e acamado em seu laboratório subterrâneo em Londres e cria o programa definitivo para “matar” a Entidade, com o roteiro sendo bem expositivo ao explicar que mais uma vez o fim do mundo está próximo e que Hunt precisa se entregar juntamente com a chave. As exposições começam a cansar logo no começo. Parece que o diretor esqueceu que a franquia não tem na verborragia seu ponto forte. Tratar o público assim não é bom sinal para o começo de um filme.
Em “O Acerto Final”, há certa forçação de barra para conectar a nova missão, não apenas no filme anterior, mas para fazer uma amarração de todas as aventuras de Ethan Hunt e equipe ao momento climático atual. Isso passa por tratar o personagem como um Jesus super radical, que não estava completando missões graças apenas a suas habilidades e por ser seu emprego, mas por ser uma espécie de guia para livrar o mundo de todo o mal.
Acontece que as estripulias salvadoras de Ethan Hunt já estão ditas e feitas ao longo de todos esses anos e afirmar categoricamente na boca de vários personagens (ainda que o protagonista seja avesso a isso) que só ele pode fazer o trabalho de mudar o mundo, é redundante e cansativo.
Ao tentar prestar homenagem ao passado, muitas vezes o filme cai no humor involuntário, tropeçando em conveniências completamente sem sentido, enxertando gordura desnecessária ao filme, o que faz com que a experiência pese em alguns momentos. A duração de 2h50m não se justifica.
Se há falhas em jogar referências soltas como se fosse um filme da Marvel acenando com easter eggs, há um acerto ao resgatar um personagem improvável e integrá-lo à trama de forma orgânica e que sirva ao desenrolar do roteiro de forma satisfatória. De fato, é um momento que vai gerar um sorriso nos fãs da franquia.

Entretanto, nada do que foi escrito importa muito. Afinal, queremos saber se Tom Cruise e a sua obsessão por cenas de ação reais fazem jus a uma ida ao cinema. A resposta é definitivamente SIM! Cruise segue elevando o padrão. O ator e sua equipe de dublês seguem fazendo loucuras para esfregar na cara de Hollywood que CGI faz pouca falta quando se tem talento e muita raça.
A pancadaria sincera está presente, com voadoras, socos, chutes, facadas, cabeçadas e tiros, seguindo o norte da diversão em estado de excelência. E os que ficam ansiosos para as sequências solo de Ethan Hunt, há uma dentro de um submarino e outra em um avião que deixariam James Bond de cabelo em pé.
A direção das cenas é maravilhosa. Além do alto valor de entretenimento, fica a pulga atrás da orelha de como foram feitas de tão espetaculares.
Outra característica da franquia segue presente: O elenco de coprotagonistas formado Rhames, Hayley Atwell, Pom Klementieff e Simon Pegg esbanjam química, com destaque para a presença dos dois últimos, com Pegg sempre sendo dono do melhor timing cômico.
Para que um herói tenha seu altar adorado, é preciso um grande vilão e Gabriel (Esai Morales), o vilão humano do filme, tem seu destino controverso, considerando a forma ameaçadora com que foi apresentado. Morales se diverte com seu ar canastrão e seria interessante que ele não tivesse que dividir a vilania com um malfeitor tecnológico, mas os realizadores quiseram atualizar as ameaças para conversar com os tempos atuais. No entanto, pouco é aprofundado, além de explorarem a boa e velha ameaça nuclear destruindo o mundo.
Vamos ignorar deliberadamente o núcleo presidenciável, que só serviu para encher linguiça e desperdiçar os talentos de Angela Basset e cia.
“O Acerto Final” desliza em seu primeiro ato, quase dá um frio na barriga ante um desastre iminente, mas a montagem de Eddie Hamilton segura as pontas e então o público pode enfim mergulhar nas façanhas de Tom Cruise e seu indefectível Ethan Hunt. Se este for mesmo o fim da franquia (improvável), Missão Impossível fecha de forma digna seu legado, deixando de herança, além do nível altíssimo de entretenimento, uma mensagem poderosa de que o cinema ainda é uma das artes mais grandiosas e satisfatórias já inventadas e só alguém que ama o cinema como Tom Cruise pode deixar saudade com uma franquia de ação e porradaria.