A cantora portuguesa Cuca Roseta, uma das maiores fadistas de sua geração, lança este mês o décimo álbum de carreira, totalmente dedicado à música brasileira. “Até a fé se esqueceu” resgata pérolas do cancioneiro nacional e apresenta também uma safra recente de composições, formando um arco cronológico que começa em 1937 e termina em 2024. O álbum chega às plataformas de streamingidealizado e produzido por João Mário Linhares para o selo MP,B / Som Livre. A artista fará uma minitemporada de shows no Brasil, com início no fim de abril, em cidades que em breve serão anunciadas.
O repertório foi escolhido a dedo. “Escolhemos grandes compositores e poetas e demos toda a atenção à palavra. É uma declamação de poesia cantada, uma história que vem do coração. Ela só ganha asas se for cantada pela voz da alma. Também no fado português colocamos nosso ego de lado e nos entregamos a cada palavra como se nela coubesse todo o mundo”, afirma Cuca.
Lançado por Aracy de Almeida em 1946 como um lado B, o samba-canção “Saia do caminho”, com melodia de Custódio Mesquita e letra confessional e sofrida de Evaldo Ruy, foi gravado por uma constelação de cantoras brasileiras: Dalva de Oliveira, Zezé Gonzaga, Gal Costa, Nana Caymmi, Ângela Maria, Elza Soares, Rosa Passos, Olivia Byington, Verônica Sabino, Marisa Gata Mansa, Eliana Pittman e tantas outras, para não falar da mais marcante, Miúcha, com o piano de Tom Jobim.

O passeio pela música brasileira traz dueto de Cuca e Zeca Pagodinho numa clássica seresta, aqui sim levada em espírito de fado: “Arranha-céu” (1937), de Silvio Caldas e Orestes Barbosa. Nela, o arranjador Marcelo Caldi mistura um piano moderno com um acordeão nostálgico, como se a reunisse “Saia do caminho” e “Sem você”, numa trilogia de canções de (des)amor.
A jornada pela música brasileira chega a 2024, em faixa que traz melodia de Zé Renato sobre letra da própria cantora, “Até a fé se esqueceu”, primeiro single do álbum, lançado em abril do ano passado. Essa canção de amor totalmente contemporânea, em letra e música, mereceu arrojado arranjo de violão de Marcelo Gonçalves (do Trio Madeira Brasil), executado por João Camarero, com participação vocal de Seu Jorge. Aqui é como se Cuca Roseta encontrasse a mais refinada e moderna música brasileira de hoje. Não por acaso, mas por sua grandeza, “Até a fé se esqueceu” dá título ao álbum.